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quinta-feira, 8 de setembro de 2011

  
É assim a vida


Na caminhada que faço sempre arrumo amigos. Um dia nos vemos, outros não, mas é sempre aquela turma fazendo cooper, para a saúde manter.
Chico é meu amigo faz tempo e quando podemos, vamos até o bar da esquina, bater papo, contar coisas da vida e assim dividir os problemas, as alegrias.
Chico me contou que está com a filhinha doente, faz um ano. Uma doença incurável e que, além de fazer a garota se acabar, todos sofrem com ela e nada podem fazer. O dinheiro também é pouco para tantas despesas.
O Tonho, coitado, foi abandonado pela mulher, que o trocou por outro homem, daqueles galãs que aparecem na vida somente para desfazer o lar alheio. Ela deixou filhos, mãe, tudo por causa de um amor passageiro
Cada um conta um pouco de sua vida e eu também conto a minha. Os dias passam e a gente nem sente...
Já está quase no fim do ano. Logo as ruas começam a ficar cheias, com as pessoas fazendo compras para o Natal.
Como será o Natal de cada um de nós? Uma incógnita. Todos esperam que corra tudo bem, na paz do Senhor e a família reunida, que é o maior presente de Deus.
Certa noite, Chico me convidou para ir ver seu trabalho, pois nunca havia visto o meu amigo de caminhada, de boteco, trabalhar, e nem sabia o que fazia. Caminhamos uns quarteirões e logo vi um enorme Circo montado, num local plano, agradável...O povo estava chegando para a sessão e entramos pelos fundos até o camarim, onde meu amigo iria se preparar para a apresentação que para ele era um bálsamo, um descanso, uma alegria fazer o que fazia.
Chico era o palhaço Zuzu e querido não só pela garotada como também pelos adultos.
Em alguns minutos meu amigo estava pronto: cara pintada, nariz vermelho,peruca de cabelo amarelo, uma roupa enorme que cabia dois dele. Chico estava feliz... O povo o esperava.
O espetáculo começou e todos os artistas deram aquela volta no picadeiro e saíram para esperar sua hora.
Voltamos para o camarim e ficamos conversando, quando um seu vizinho chega e, chorando, diz ao bom e grande amigo que sua filha acabara de falecer. Mesmo por trás daquela pintura, de toda parafernália que um palhaço usa, eu vi no rosto do meu amigo o abatimento, a tristeza, as lágrimas escorrendo numa dor insuportável... Parecia que alguém tinha tirado seu coração. Eu o confortei e abraçados choramos muito... Eu não conhecia ninguém da família dele mas, quem não entristece com uma cena assim?
Alguns minutos se passaram e, lá dentro do circo começaram a chamar pelo Palhaço Zuzu. A platéia gritava seu nome num ensurdecedor coro. Eu quis impedi-lo de sair. Não era possível uma pessoa naquele estado emocional enfrentar uma multidão, para fazê-la rir.
Chico retocou a maquiagem, me deu um abraço e disse:
-Eu vou lá companheiro. O show não pode parar. O palhaço é a atração principal das crianças e não posso decepcioná-las. Tenho que primeiro cumprir meu dever, o de fazer o povo dar risadas, mesmo que meu coração esteja estraçalhado pela dor....
E lá foi o Chico, caminhando lentamente, quase sem forças, até chegar á cortina que o separava do picadeiro. De repente ele gritou:
-Hoje tem marmelada? E o povo respondia: “Tem sim senhor”...
- Hoje tem goiabada? “ Tem sim senhor...”
- E o palhaço, o que é? “ É ladrão de mulher...”
E assim meu amigo Chico fez o espetáculo e ninguém ficou sabendo que por dentro seu corpo ardia de dor, seus olhos deixavam escorrer lágrimas pela perda da filha há tão poucos minutos.
Eu fui embora pra casa, com o coração partido também, pensando como a vida é tragicômica
O homem de caráter cumpre o seu dever mesmo passando por cima de qualquer dor, de qualquer problema.
Lembrei então de uma frase que li há muito tempo e infelizmente não sei o autor|:
“-Ri palhaço e o mundo rirá contigo... Chora palhaço e chorarás sozinho...”

 

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